A Ekklesia

“À igreja de Deus… aos santificados em Cristo Jesus, chamados santos, com todos os que em todo lugar invocam o nome de nosso Senhor Jesus Cristo.” — 1 Coríntios 1:2

“Ekklesia” é uma palavra grega que é traduzida como igreja. No NT (Novo Testamento) significa um grupo, conjunto ou associação de pessoas que foram ajuntadas umas às outras.

Hoje, existem muitas organizações que afirmam ser a igreja e têm vários laços de união; mas desejamos saber, com base na autoridade da Palavra de Deus, que ekklesia, corpo ou igreja Jesus estabeleceu e quais são seus laços de união; em segundo lugar,

desejamos mostrar que todo cristão deve pertencer a essa igreja; em terceiro lugar, os efeitos prejudiciais de se unir a uma ekklesiaou igreja errada; e, em quarto lugar, tendo se unido à igreja certa, quais são os resultados de perder essa membresia.

Primeiro, então, a igreja que Jesus começou a reunir durante seu ministério, e que foi reconhecida pelo Pai no Pentecostes depois que o preço do resgate foi pago, era o pequeno grupo de discípulos que consagraram o tempo, os talentos e a vida terrestre em sacrifício a Deus. Eles foram organizados e unidos como membros de uma sociedade e, como tal, tinham leis e governo e, consequentemente, um chefe ou autoridade governante reconhecida. Entre eles havia os laços de amor e do interesse comum. Visto que todos foram alistados sob a capitania de Jesus, as esperanças e temores, bem como alegrias, tristezas e objetivos de um eram os do outro; e assim tinham uma união de coração muito mais perfeita do que poderia ser obtida de uma união baseada em qualquer credo elaborado pelo homem. Assim, sua organização era do Espírito; sua lei para o governo de cada um era o amor, e todos, como um todo, foram submetidos à obediência à “lei do Espírito” conforme expressa na vida, ações e palavras de seu Senhor. Seu governo era a vontade daquele que disse: “Se me amais, guardai os meus mandamentos.”

Assim, vemos a igreja primitiva organizada, governada e em perfeita unidade e harmonia sob o governo ou chefia de Jesus. Compare essa organização da igreja com o que agora afirma ser uma continuação da mesma, a saber, as várias organizações denominacionais, cada uma das quais prende seus membros a uma união mental com base em algum credo ou dogma próprio (muitos deles nada amorosos) e cada uma com suas próprias leis.

Essas leis emanam de seus cabeças ou governantes e legisladores; portanto, vemos claramente que essas igrejas dos dias atuais têm e reconhecem como cabeças, ou poderes governamentais, os antigos fundadores de seus vários credos, ao passo que seu clero em conferências, concílios, sínodos e presbitérios, interpretam e reforçam as “tradições dos anciãos” que “anulam a Palavra de Deus”. Eles ocupam o lugar do verdadeiro cabeça da igreja — Jesus — e do verdadeiro mestre e guia para toda a verdade, o Espírito Santo. Preste atenção ao que o profeta Isaías declara (cap. 9:15): “O ancião e honrado, ele é a cabeça. E o profeta que ensina mentiras, ele é a cauda.”

Será que reconhecerão que isso é assim? Não no caso de Babilônia, a Grande — a mãe das prostitutas, e todas as suas filhas, a igreja nominal completa neste dia mau, representada em Isaías 4:1 como sete mulheres que se agarram a um homem (Cristo Jesus) e dizem: “Comeremos nosso próprio pão (que o mundo fornece) e vestiremos nossas próprias vestes (os trapos imundos de sua própria justiça), apenas deixe que sejamos chamadas pelo teu nome, para tirar nossa reprovação.” E então usam o nome de Cristo e chamam suas organizações de igrejas cristãs. A união delas é uma união de mãos, mas não uma união de corações.

“São palavras difíceis, quem pode recebê-las?” Mas essas não são as nossas palavras: é a voz de advertência da
“segura palavra de profecia… à qual fazeis bem em prestar atenção”. E é uma voz amorosa, pois nosso Senhor declara: “Eu repreendo e castigo a todos quantos amo.”

Existem dois sentidos em que a verdadeira igreja de Cristo pode ser considerada: Todos os que, como a igreja primitiva, consagram-se totalmente para fazer a vontade de nosso Pai, submissos apenas à vontade e ao governo de Cristo, não reconhecendo e obedecendo a nenhum outro — esses santos, do início da Era do Evangelho até o seu fim, quando toda a classe for selada e a porta para o chamado celestial se fechar, constituem a “IGREJA DO PRIMOGÊNITO”, cujos nomes estão escritos no céu. Todos esses são “um” em objetivo, esperança e sofrimento, e, no devido tempo, serão coerdeiros com Jesus Cristo da grande herança — herdeiros do reino que Deus prometeu aos que o amam.

O outro sentido em que essa mesma classe é reconhecida é por se considerar a parte pelo todo, assim, todos os viventes dessa classe podem ser chamados de igreja; ou, novamente, qualquer parte dessa classe de seguidores vivos que podem se reunir, pode ser apropriadamente chamada de igreja; pois, pela palavra de Jesus, sabemos que onde quer que dois ou três estejam reunidos, ele estará entre eles; consequentemente, isso seria uma reunião da igreja — uma assembleia da “igreja do Primogênito”. A assembléia geral será quando toda a igreja se tornar como seu cabeça Jesus — e for glorificada com ele.

Essa, então, é nossa definição da igreja de Cristo; e ela é perfeitamente ilustrada por Paulo (Rom. 12:4, 5) quando ele compara a igreja ao corpo humano. Nessa ilustração, Jesus representa a

cabeça, e todos os que são seus constituem o corpo, sobre o qual e através do qual a cabeça governa. Jesus foi e sempre será o cabeça de sua igreja como um todo; ele é igualmente o cabeça e governante de toda a igreja viva, e em cada grupo onde dois ou três se reúnem em

nome dele, ele é o cabeça, governante e mestre. Caso perguntem:

“Em que sentido ele ensina?” Respondemos: por exercer sua prerrogativa de cabeça, ou mestre; por usar um ou mais dos presentes para revelar a verdade, fortalecer a fé, encorajar a ter esperança, inspirar zelo, etc., assim como a cabeça do corpo literal pode convocar um membro para ministrar a outro. Mas cabe aqui uma palavra de cautela: Se alguém se tornar um instrumento tão útil quanto a mão direita, cuide para não aspirar a ser o cabeça. Não se ensoberbeça; o orgulho o paralisará e o tornará inútil: “Não sejais chamados Rabi (Mestre, instrutor), pois um é o vosso Mestre (cabeça), Cristo, e todos vós sois irmãos.” E não deixe que o menor dos membros despreze seu cargo, “porque se todos fossem o mesmo membro, onde estaria o corpo?” “Antes, os membros do corpo que parecem ser mais fracos são necessários” — “Deus colocou os membros no corpo, cada um deles como quis.”

Quão simples, belo e eficaz é o plano de organização de Deus!

Isso nos leva à nossa segunda proposição, a saber: que todos os cristãos devem se unir a essa organização. À luz do que acabamos de dizer sobre a classe que compõe a igreja que Jesus organizou, fica claro que se você abriu mão de toda a sua vontade, talento, tempo, etc., você é reconhecido por Jesus como um seguidor e membro da ekklesia, ou corpo, do qual ele é a cabeça e cujos nomes estão escritos no céu. Assim, nos unimos à igreja de Jesus e temos nossos nomes registrados como membros, pela consagração. Mas alguém pode dizer: “Será que eu não deveria me juntar a alguma organização na Terra, concordar com seu credo e ter meu nome escrito na Terra?” Não! Lembre-se de que Jesus é o seu padrão e mestre, e nem em suas palavras, nem em seus atos você encontrará qualquer autoridade para vincular-se aos credos e tradições dos anciãos, que tendem a tornar a palavra de Deus sem efeito (Marcos 7: 13) e submetê-lo a uma escravidão que impedirá o seu crescimento na graça e no conhecimento, e contra a qual Paulo nos advertiu: “Permaneçamos, pois, firmes na liberdade com que Cristo nos libertou, e não nos submetamos outra vez ao jugo da escravidão.” (Gál. 5:1)

Mas alguns dizem: “Se não é apropriado nos unirmos a qualquer uma das igrejas nominais atuais, não seria bom formarmos nossa própria organização visível?” Sim, e é isso que temos — uma organização feita aos moldes da igreja primitiva. Cremos ter voltado à simplicidade primitiva: só o Senhor Jesus é nosso cabeça ou legislador, o Espírito Santo é nosso intérprete e guia para a verdade; nossos nomes estão todos escritos no céu; estamos unidos pelo amor e pelo interesse comum.

Mas você pergunta: “Como vamos nos conhecer?” Respondemos: Por que precisaríamos de uma identificação denominacional para nos ajudar a nos conhecer quando o Espírito de nosso Mestre se manifesta em palavras e atos, maneiras e aparência? Sim, a fé viva, o amor não fingido, a mansidão longânime, a simplicidade infantil juntamente com a constância e o zelo da maturidade tornam manifestos os filhos de Deus, e não precisamos de nenhum registro terreno, pois os nomes de todos eles estão escritos no livro da vida do Cordeiro.

Os enfermos precisam de visita ou de alguma assistência? Os verdadeiros cristãos estão prontos a fazer isso com seu tempo consagrado. A obra do Senhor requer dinheiro? Os verdadeiros cristãos estão prontos a fazer isso com seus recursos consagrados. Sua obra traz sobre eles o opróbrio do mundo? Eles também sacrificaram a reputação — seu tudo — tudo a Deus.

Mas, novamente, você pergunta como devemos lidar com alguém que anda desordenadamente em nosso meio; se não temos uma organização como a que costumamos ver, como podemos nos livrar de alguém assim, do modo que o Senhor requer que façamos? Respondemos: Faça exatamente como Jesus e Paulo orientaram.

Hoje, como na igreja primitiva, há vários graus de desenvolvimento entre os membros individuais, e Paulo diz (1 Tes. 5:14) que, aos que têm pouco ânimo, devemos consolá-los; aos que são fracos, devemos ampará-los; mas ao passo que devemos ser pacientes com todos, precisamos alertar aos desordeiros de que estão se afastando do verdadeiro espírito de Cristo. Não confunda os desordeiros com os fracos (que devem ser amparados) nem com os desanimados (que devem ser consolados); mas com paciência e amor, alerte os desordeiros. A quem ele chama de desordeiro? Sem dúvida, existem muitas maneiras de andar desordenadamente, mas em 2 Tes. 3:11, ele fala de alguns que não trabalham, mas se intrometem na vida alheia, e diz que tais deveriam fazer como ele — trabalhar para que não sejam um fardo para ninguém; e que se alguém não trabalhar, também não deve comer. Assim ele disse e agiu, para que pudesse ser um exemplo para os outros. Depois, novamente, no v. 14: Se depois de terem alertado tal pessoa ela não mudar, “não vos mistureis com ele, para que se envergonhe. Todavia, não o considere como inimigo, mas admoestai-o como um irmão.”

Mais uma vez, Jesus dá instruções explícitas quando houver uma questão de ofensa entre dois irmãos, em Mat. 18:15, 17: “Se teu irmão pecar contra ti, vai, e diz-lhe a sua culpa entre ti e ele somente; se ele te ouvir, ganhaste a teu irmão. Se, porém, ele não te ouvir, então leva contigo mais um ou dois, para que pela boca de duas ou três testemunhas cada palavra seja confirmada. E, se ele recusar ouvi-los, dize-o à igreja; mas se recusar ouvir a igreja, seja ele para ti como um homem gentio e um publicano.”

Se, sob a organização de nosso cabeça, obedecermos a seus mandamentos, que é o que faremos se o amarmos, quão poucos serão os mal- entendidos e dificuldades entre os irmãos! Essa organização tem seus evangelistas, pastores e instrutores nomeados e dirigidos pelo Senhor. Eles não precisam de imposição de mãos pela chamada sucessão apostólica; pois o “Espírito do Senhor ungiu” todos os membros do corpo “para pregar”, etc., (Isa. 61:1) e é dever de cada membro do corpo exercer seu ofício para a edificação dos demais membros.

Quão completa é a organização da igreja de Cristo com sua membresia escrita no céu, vinculada pelo amor e governada pelo Espírito! Mas qual seria a triste consequência de confundirmos a igreja nominal com a verdadeira?

A importância de nossa quarta proposição carece de maiores explicações. Na verdade, seria uma grande tragédia perder nossa condição de membro da verdadeira igreja ou corpo de Cristo. E nenhum membro está fora desse perigo, a menos que mantenha uma estrita vigilância sobre a velha natureza, contada como morta, para que essa não volte à vida e se afirme na forma de orgulho, egoísmo, inveja, calúnias e coisas assim, não é verdade? Mas se estivermos cheios de amor (o amor que leva ao sacrifício) e revestidos de humildade, e sob a cobertura do sangue redentor, estaremos seguros na igreja (corpo), tendo a certeza de que “o Pai se gradou de nos dar o Reino”.

Sim, o reino é o destino glorioso da verdadeira igreja — o “pequeno rebanho” — que agora está trilhando o caminho da humilhação e bebendo do cálice amargo da morte. Ó, a glória que será revelada em nós ainda não é visível, exceto aos olhos da fé, mas as tentações e provações são muito evidentes em todos os aspectos! “Portanto, temamos, a fim de que a promessa deixada para nós de entrar em seu repouso não exclua a nenhum de vós.” (Heb. 4:1)

Assim, Paulo advertiu os outros e temeu, “para que (mesmo depois) de ter pregado a outros, ele mesmo não fosse rejeitado”. (1 Cor. 9:27) Podemos ter nossos nomes considerados malignos pelos da igreja nominal e ainda assim “regozijar- nos e estar muito contentes porque nossos nomes estão escritos nos céus”. Eles podem olhar para nós com desprezo e nos usar com malícia, bem como dizer falsamente todo tipo de mal contra nós. Podem também tentar nos fazer voltar com lisonja, dizendo que não podem perder nossa influência — que estaríamos fazendo um grande bem por permanecer entre eles. Ó, como é necessária, neste dia mau, a fé —

“Que se mantém impassível face à desaprovação do mundo,

Nem dá atenção ao seu sorriso lisonjeiro;

Que os mares de problemas não podem afogar,

Nem as artimanhas de Satanás, seduzir.”

Amados, voltemos a repetir a advertência: “Permaneçamos, pois, firmes na liberdade com que Cristo nos libertou, e não nos submetamos outra vez ao jugo da escravidão” — nem mesmo no mais leve grau.

A Torre de Vigia de Sião, outubro/novembro de 1881 (R295)