(Português 🇧🇷)
A Sociedade Torre de Vigia concorda que a lei de Moisés já não se aplica aos cristãos. No entanto, a Sociedade diz que esta regra particular sobre não comer sangue foi repetida para os cristãos no assim chamado decreto apostólico pelo concílio apostólico em Jerusalém. O argumento deles diz isto:
“Observe o que aconteceu quando, anos depois da morte de Jesus, surgiu uma questão a respeito de se quem se tornasse cristão tinha de guardar todas as leis de Israel. Isto foi discutido num concílio do corpo governante cristão, que incluía os apóstolos. Tiago, meio-irmão de Jesus, referiu-se aos escritos que continham as ordens sobre o sangue, declaradas a Noé e à nação de Israel. Seriam elas obrigatórias para os cristãos? — Atos 15:1-21.
“Aquele concílio enviou sua decisão a todas as congregações: Os cristãos não precisavam guardar o código dado a Moisés, mas era ‘necessário’ que eles ‘persistissem em abster-se de coisas sacrificadas a ídolos, e de sangue, e de coisas estranguladas [carne não-sangrada], e de fornicação’. (Atos 15:22-29) Os apóstolos não estavam apresentando um mero ritual ou um regulamento dietético. O decreto estabelecia normas éticas fundamentais, que os cristãos primitivos acataram. Cerca de uma década depois, eles reconheceram que ainda deveriam ‘guardar-se do que é sacrificado a ídolos, bem como de sangue e da fornicação’. — Atos 21:25.” [Como Pode o Sangue Salvar a Sua Vida? (1990), p. 5]
É espantoso que esta brochura de 32 páginas trate o texto bíblico de forma tão descuidada. A Sociedade Torre de Vigia nunca forneceu uma análise cuidadosa desta passagem bíblica que é a pedra angular da sua posição sobre o sangue. Os versículos usados como textos de prova são tirados do contexto de forma desonesta.
Em praticamente todo o comentário bíblico jamais escrito sobre o livro de Atos, está cuidadosamente demonstrado quão errada é essa aplicação. Os contra-argumentos que apresentaremos agora são completamente desconhecidos para a vasta maioria das Testemunhas de Jeová. A Sociedade Torre de Vigia nunca tentou seriamente responder a estes contra-argumentos e nem sequer cita todos os textos bíblicos relevantes quando trata o assunto do sangue.
Antecedentes
Um dos problemas mais importantes na primitiva congregação cristã era o relacionamento entre gentios e cristãos. Embora a nova religião tivesse as suas origens no Judaísmo, um número significativo de membros eram não-judeus. Alguns cristãos judeus argumentaram que os gentios convertidos tinham de ser circuncidados e tinham de obedecer à Lei, vivendo assim como prosélitos judeus. Paulo, que tinha sido largamente responsável por trazer gentios para dentro da congregação cristã, discordava.
“Certos homens desceram então da Judéia e começaram a ensinar os irmãos: “A menos que sejais circuncidados, segundo o costume de Moisés, não podeis ser salvos.” 2 Mas, quando havia ocorrido não pouca dissensão e disputa com eles da parte de Paulo e Barnabé, providenciaram que Paulo e Barnabé, e alguns outros deles, subissem até os apóstolos e anciãos em Jerusalém, com respeito a esta disputa.” (Atos 15:1-2)
É evidente a partir de muitas passagens do Novo Testamento que os conflitos entre cristãos gentios e cristãos judeus foram longos e exaltados. Paulo e Barnabé estavam entre aqueles que argumentavam que não era necessário obedecer à Tora. Contra eles estavam “certos homens” da Judeia, provavelmente de Jerusalém, que tinham vindo a Antioquia para se certificarem de que Paulo ensinava os novos convertidos segundo a tradição de Moisés.
Não havia outra razão para ir a Jerusalém exceto o fato de “certos homens” terem vindo desse lugar. A “congregação mãe” em Jerusalém naturalmente gozava de um certo estatuto, e é provável que os homens judeus tivessem invocado a autoridade dos apóstolos, dando assim a impressão de que o ensino controverso vinha dos próprios apóstolos (veja Atos 15:24). Consequentemente, para encontrar a origem da mensagem controversa e para descobrir se este era mesmo o ensino dos apóstolos, a congregação de Antioquia enviou Paulo e Barnabé a Jerusalém.
Uma vez chegados ali, eles foram calorosamente recebidos, mas também houve oposição:
“Contudo, alguns dos da seita dos fariseus, que haviam crido, levantaram-se dos seus assentos e disseram: “É necessário circuncidá-los e adverti-los que observem a lei de Moisés.” (Atos 15:5)
Porém, estes homens ficaram sem apoio no debate, a julgar pelo curto sumário do concílio que encontramos no livro de Atos. Pedro afirmou enfaticamente:
“Ao contrário, confiamos em ser salvos por intermédio da benignidade imerecida do Senhor Jesus, do mesmo modo como também essas pessoas.” (Atos 15:11)
A benignidade imerecida, ou graça, e não obras de qualquer tipo, era a base para a salvação. Depois de ouvir os relatórios de Paulo e Barnabé sobre as maravilhas que o espírito realizara entre os gentios, Tiago deu o impressionante discurso que iria dar por terminado este “concílio apostólico”.
A decisão
A tensão entre cristãos judeus e cristãos gentios era um problema que precisava de solução. Tal como Paulo e Pedro, Tiago afirmou enfaticamente que não se devia exigir dos gentios que obedecessem à Tora. Porém, para diminuir as tensões, Tiago disse:
“Por isso, a minha decisão é não afligir a esses das nações, que se voltam para Deus, 20 mas escrever-lhes que se abstenham das coisas poluídas por ídolos, e da fornicação, e do estrangulado, e do sangue.” (Atos 15:19-20)
A Sociedade Torre de Vigia alega que estas regulações eram eternas e vinculativas para toda a humanidade, e consequentemente eram uma exigência para que todos os cristãos se abstivessem de sangue. Mas o texto não diz isso. O que é discutido não é o conjunto mínimo de princípios a que um cristão tem de obedecer, visto que há vários de tais princípios que não estão incluídos aqui, como por exemplo não mentir, não matar, etc. Por que é que Tiago só menciona estas quatro coisas? A chave é dada por Tiago no versículo seguinte:
“Pois, desde os tempos antigos, Moisés tem tido em cidade após cidade os que o pregam, porque ele está sendo lido em voz alta nas sinagogas, cada sábado.” (Atos 15:21)
Sim, a razão para esta recomendação é que Moisés é lido em voz alta cada sábado. Note que a palavra “Pois” é uma continuação direta das palavras anteriores. Como é que a leitura de Moisés pode ser uma causa direta para se escrever aos gentios que se abstenham de sangue?
A resposta pode ser encontrada examinando quais são as quatro coisas enumeradas aqui. Recordemos o resumo dos regulamentos de Levítico 17:1 a 18:27. Estas eram algumas partes específicas da lei dietética, nomeadamente, eram aquelas partes que também se aplicavam aos estrangeiros vivendo em Israel. As regras que Tiago pediu que os cristãos gentios aceitassem eram exatamente as mesmas regras que um estrangeiro vivendo em Israel tinha de aceitar. Ele tinha de se abster de ofertas de alimento aos ídolos, de comer sangue e animais estrangulados (evidentemente incluindo aqueles que tinham morrido por si mesmos), e tinha de respeitar as leis relativas ao sexo, que iam muito para além da definição de “fornicação” que um gentio conhecia.
As quatro coisas que Tiago enumerou são os mesmos regulamentos que encontramos em Levítico 17 e 18, e até são enumerados pela mesma ordem.
É sobre isto que a Sociedade Torre de Vigia não quer que os seus seguidores pensem. As palavras em Atos 15:21 “Pois, desde os tempos antigos…”, não têm significado rigorosamente nenhum se estas são leis absolutas e universais de Deus para a humanidade. Como é que a leitura da lei de Moisés em sinagogas judaicas podia ser uma razão para gentios aderirem a leis universais? Ao contrário, faz todo o sentido quando compreendemos que estas eram as leis mínimas a que um cristão gentio tinha de obedecer para ser de algum modo aceite numa comunidade judaica.
Nas partes orientais do Império Romano, fora da Palestina, cerca de 15 a 20% da população era constituída por judeus. Normalmente os judeus e os gentios não se associavam uns com os outros (veja Gálatas 2:11-14). No entanto, se os cristãos gentios aceitassem estes regulamentos estabelecidos para estrangeiros vivendo em Israel, seria socialmente mais aceitável para os cristãos judeus associar-se com eles. Esta condição para a associação era bem conhecida, não só para os judeus, mas também para gentios. Tiago referiu-se a este fato quando resumiu rapidamente a lei em Levítico 17:1 a 18:27 com as palavras “que se abstenham das coisas poluídas por ídolos, e da fornicação, e do estrangulado, e do sangue”.
Esta é a explicação que reúne o acordo da vasta maioria dos peritos:
“O motivo para emitir o Decreto Apostólico, deve notar-se, foi resolver a questão de saber se devia exigir-se que os gentios convertidos ao cristianismo se submetessem ao ritual da circuncisão e cumprissem os outros estatutos mosaicos. O Concílio decidiu que tal observância não era requerida para a salvação; contudo, ao mesmo tempo, com o objetivo de evitar ofender desnecessariamente os cristãos judeus (e judeus que consideravam a hipótese de tornar-se cristãos), o Concílio pediu aos gentios convertidos que fizessem certas concessões por razões de prudência, abstendo-se daqueles atos que ofenderiam os escrúpulos judeus e que impediriam o convívio social [entre gentios e judeus], incluindo a participação em comum na Ceia do Senhor.”1
“Continuava a haver, porém, um problema prático. Na maioria das igrejas os crentes gentios tinham de viver lado a lado com crentes judeus, que tinham sido educados na observância de várias leis alimentares e a evitar tanto quanto possível o convívio social com gentios. Embora já não fosse necessário requerer aos gentios que se submetessem à lei cerimonial, eles fariam bem em comportar-se de um modo que mostrasse consideração para com os seus “irmãos mais fracos” de nascimento judeu, pois não se podia esperar que todos estes adquirissem uma perspectiva tão emancipada em relação às leis alimentares como Pedro e Paulo. Portanto, sem comprometer a liberdade cristã dos gentios, Tiago apresentou a sua opinião considerada de que devia pedir-se-lhes que respeitassem os escrúpulos dos seus irmãos judeus, evitando carne que tinha associações idólatras ou que não tivesse sido devidamente sangrada, e por conformarem-se ao alto código judeu de relações entre os sexos em vez de continuarem contentes com os padrões pagãos mais baixos a que tinham sido habituados. Isto suavizaria o caminho da associação social e à mesa [das refeições] entre os cristãos de nascimento judeu e gentio.”2
“[Versículo] 20. mas devemos instruí-los: A ligação adversativa disto a “afligir” (v. 19), e a recapitulação dos versículos 10-11 no versículo 19, demonstram que o ‘decreto’ é uma concessão em vez de uma imposição, tornando possível a vida e as refeições em comum sem lançar qualquer ônus sobre os recém-chegados. As quatro condições (também no versículo 28; 21:25) parecem ser quatro das coisas proscritas em Levítico 17-18 para estrangeiros residindo em Israel: carne oferecida a ídolos, comer sangue e comer animais estrangulados (não mortos segundo o ritual), e relações sexuais com parentes próximos.”3
Esta interpretação também é apoiada por vários outros versículos da Bíblia que a Sociedade Torre de Vigia se vê obrigada a explicar de forma diferente. Examinemos em primeiro lugar a conclusão do concílio. Eis os versículos tão bem conhecidos, e tão pouco compreendidos, pelas Testemunhas de Jeová:
“Mandamos, portanto, Judas e Silas, para que eles também possam relatar as mesmas coisas por palavra. 28 Pois, pareceu bem ao espírito santo e a nós mesmos não vos acrescentar nenhum fardo adicional, exceto as seguintes coisas necessárias: 29 de persistirdes em abster-vos de coisas sacrificadas a ídolos, e de sangue, e de coisas estranguladas, e de fornicação. Se vos guardardes cuidadosamente destas coisas, prosperareis. Boa saúde para vós!” (Atos 15:27-29)
As Testemunhas de Jeová geralmente interpretam isto como uma ordem para se abster de, entre outras coisas, sangue. Porém, tal como várias fontes acima citadas notaram, o texto não é uma ordem. O bem conhecido comentarista bíblico F. F. Bruce diz:
“Embora o grego do N[ovo] T[estamento] seja bem fornecido de verbos de ordem, é digno de nota, conforme F. J. A. Hort frisou, que nenhum deles seja usado aqui.”4
Mesmo que este texto se aplicasse a cristãos que vivem hoje, as próprias palavras testificam que definitivamente não é uma ordem. Bruce também cita Hort como tendo dito que o texto é “uma forte expressão de opinião, mais do que conselho e menos do que uma ordem.”5 A partir daqui, compreendemos que quando o concílio disse “estas coisas necessárias”, referia-se a coisas necessárias para evitar conflito entre cristãos judeus e gentios, que era o motivo da toda a controvérsia desde o início.
Vários outros versículos bíblicos apoiam esta conclusão:
Atos 21 — “Todos eles são zelosos da Lei”
A fricção entre cristãos judeus e gentios não terminou com o assim chamado decreto do Concílio Apostólico de Atos capítulo 15. Antes pelo contrário, quando Paulo voltou a Jerusalém algum tempo depois ele viu-se metido no meio da mesma discussão. Tiago disse-lhe:
“Observas, irmão, quantos milhares de crentes há entre os judeus; e todos eles são zelosos da Lei. 21 Mas eles ouviram rumores a respeito de ti, de que tens ensinado a todos os judeus entre as nações uma apostasia contra Moisés, dizendo-lhes que não circuncidem os seus filhos nem andem nos costumes [solenes]. 22 O que se há de fazer, então, a respeito disso?” (Atos 21:20-22)
Obviamente, embora Tiago e toda a congregação em Jerusalém já tivessem decidido que isto estava de fato correto, muitos tinham dificuldade em engolir isso, especialmente os judeus de conversão mais recente. Com efeito, já era suficientemente grave que os gentios não fossem obrigados a seguir a Tora, mas a conclusão óbvia de que os cristãos judeus também não precisavam de a seguir era tão controversa que Tiago nem sequer se atreveu a levantá-la. Antes pelo contrário, Tiago delineou duas linhas de ação para acabar com os assim chamados rumores de que Paulo estava a falar contra Moisés: Paulo devia realizar um ritual judaico bem conhecido, a purificação cerimonial, junto com quatro homens cristãos judeus muito obedientes à Lei. Isto daria a todos os judeus a impressão de que os rumores eram falsos e que Paulo estava ‘guardando também a Lei’.
Tiago e os outros, conforme vimos, já tinham enviado uma carta instruindo os cristãos gentios a não ofenderem os judeus:
“Quanto aos crentes dentre as nações, já avisamos, dando a nossa decisão, de que se guardem do que é sacrificado a ídolos, bem como do sangue e do estrangulado, e da fornicação.” (Atos 21:25)
Estas duas linhas de ação foram levadas a cabo para evitar ofender os cristãos judeus. O contexto e a mensagem de ambas as ocorrências da lei contra o sangue no Novo Testamento (Atos 15 e 21) é que esta lei era unicamente para evitar fazer tropeçar os irmãos judeus. Esta não era uma lei universal para todos os homens, era unicamente uma questão de respeito pelas consciências dos cristãos judeus.
1 Coríntios 8 — Carne oferecida a ídolos
Paulo trata da questão de fazer outros tropeçar versus liberdade na sua primeira carta aos Coríntios. O assunto que foi tratado em Jerusalém e que discutimos acima, é tratado diretamente por Paulo nesta carta. Aqui, ele confirma diretamente que a regra sobre abster-se de ofertas a ídolos (e isto tem naturalmente de se aplicar de forma igual ao sangue) não era uma lei universal, era antes uma recomendação feita para evitar que outros tropeçassem:
“Agora, acerca dos alimentos oferecidos a ídolos: sabemos que todos nós temos conhecimento. […] 4 Ora, acerca de comer alimentos oferecidos a ídolos, sabemos que o ídolo nada é no mundo, e que não há Deus senão um só. […] 7 Não obstante, nem em todos há tal conhecimento; mas alguns, acostumados até agora com o ídolo, comem o alimento como algo sacrificado a um ídolo, e a consciência deles, sendo fraca, fica poluída.” (1 Coríntios 8:1, 4, 7)
Isto coloca um problema significativo à interpretação da Sociedade Torre de Vigia sobre Atos 15. A solução óbvia, que a interpretação da Sociedade Torre de Vigia está errada, é evidentemente inaceitável para eles. Se admitissem que a interpretação está errada, podiam perder muito prestígio, e foi derramado tanto sangue literal ao ser seguida a proibição do sangue que esta tem de ser defendida a todo o custo. A Sentinela de 1.º de abril de 1979, pp. 31-32, tenta responder a isto numa coluna de “Perguntas dos Leitores”:
“Será que o apóstolo Paulo discordou do corpo governante do primeiro século na questão de comer carne oferecida aos ídolos, conforme alguns concluem em vista da comparação de Atos 15:28, 29, com 1 Coríntios, capítulo 8?”
O modo como a pergunta está redigida pressupõe uma interpretação de Atos 15 para a qual não há apoio no próprio texto. É óbvio que a Sociedade Torre de Vigia não se quer arriscar a fazer a pergunta correta nas suas revistas, pois isso poderia levar algumas Testemunhas a pensar com clareza. De modo que a Sociedade Torre de Vigia toma a sua interpretação de Atos 15 como um dado adquirido, e constrói uma possível auto-contradição na Bíblia. Assim o leitor terá a sua atenção focada na resolução da aparente contradição, e vemos que a Sociedade Torre de Vigia afasta cuidadosamente a atenção de toda e qualquer idéia que pudesse sugerir que a solução [da contradição] está na interpretação errada da Sociedade Torre de Vigia quanto à situação que estava por detrás do concílio apostólico, e não na interpretação das palavras “carne oferecida a ídolos”.
E no entanto, é esta última a explicação que a revista apresenta. A pergunta correta não é feita na revista, por medo de dizer às Testemunhas de Jeová que este argumento existe, mas ainda assim a Sociedade Torre de Vigia tenta lidar com o argumento neste artigo, que declara:
“O que o decreto em Atos 15:28, 29, proibia era o cristão participar numa cerimônia formal, religiosa, ou cometer um ato de idolatria. Os que sacrificavam um animal ao ídolo obtinham parte da carne para comer. Fazerem isso era claramente um ato religioso; era considerado como participando numa refeição com o deus pagão. (Êxo. 34:15; Deu. 32:17; 1 Cor. 10:18-21) Os cristãos absolutamente não podiam fazer isso. O decreto do corpo governante cristão havia proibido isso, e Paulo estava de pleno acordo. Escreveu: “Portanto, meus amados, fugi da idolatria.” — 1 Cor. 10:14; 1 Tes. 1:9.” (A Sentinela, 1.º de abril de 1979, pp. 31-32)
Isto não é uma resposta, é uma contradição direta do que o texto da Bíblia diz! Atos 15:29 e 1 Coríntios 8:4 usam exatamente a mesma palavra grega. Em ambos os textos a palavra é eudolóthutos, conforme se pode confirmar consultando a Kingdom Interlinear Translation [Tradução Interlinear do Reino] da Sociedade Torre de Vigia. No entanto, a Tradução do Novo Mundo, que afirma ser uma tradução literal, diz “coisas sacrificadas a ídolos” em Atos 15:29 e “alimentos oferecidos a ídolos” em 1 Coríntios 8:4, não havendo qualquer outra razão [para traduzir a mesma palavra (eudolóthutos) de modo diferente nos dois textos] que não seja esconder as similaridades.
Não existe evidência absolutamente nenhuma de que o decreto apostólico fosse sobre “participar numa cerimônia formal, religiosa, ou cometer um ato de idolatria”. Conforme vimos, Paulo usa exatamente a mesma expressão que Lucas usou em Atos 15:29. Não há nada no contexto, ou na expressão, que indique que Atos se refere a qualquer outra prática além de comer carne oferecida a ídolos. Embora Atos 15:20 use uma expressão diferente (a Tradução do Novo Mundodiz “coisas poluídas por ídolos”), isto não dá apoio nenhum à Sociedade Torre de Vigia. A carta final e a expressão oral que Tiago usou tinham de significar exatamente a mesma coisa, caso contrário a carta não seria entendida corretamente. Não há evidência de que esta expressão se referia a outra coisa que não fosse pura e simplesmente “carne oferecida a ídolos”, e vimos isto confirmado em Atos 21.
Estes dois textos juntos provam que o texto em Atos 15:28, 29 não é um mandamento universal. Era uma forte recomendação para os cristãos gentios seguirem certas regras da Tora para evitar fazer tropeçar os seus irmãos judeus. Paulo confirma isto, e apoia a mesma recomendação, mas também declara que desde que não se faça tropeçar um irmão, é perfeitamente aceitável comer este alimento.
Finalmente, aqueles que hoje insistem em argumentar sobre leis dietéticas fariam bem em acatar o seguinte aviso do próprio Jesus Cristo:
“Não há nada de fora dum homem passando para dentro dele que possa aviltá-lo; mas as coisas que procedem do homem são as que aviltam o homem. […] 21 pois, de dentro, dos corações dos homens, saem raciocínios prejudiciais.” (Marcos 7:15, 21)
Notas
1 Bruce M. Metzger, A Textual Commentary on the Greek New Testament, (Londres: United Bible Societies, 1971-1975), p. 430.
2 F. F. Bruce, Commentary on the Book of the Acts, (Grand Rapids, Mi: Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1962), p. 311.
3 Richard J. Dillon, The New Jerome Biblical Commentary, (Englewood Cliffs, NJ: Prentice Hall, 1990), p. 752.
4 F. F. Bruce, Commentary on the Book of the Acts, (Grand Rapids, Mi: Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1962), p. 315.
5 F. F. Bruce, The Acts of the Apostles, 1990, p. 346.
Veja também: Será que as transfusões de sangue são proibidas por Deus?
Olá bom dia, tenho uma pergunta
Com base na materia apresentada os cristão de uma maneira geral pode consumir alimentos que contem sangue?
Obrigado
Quanto a se alguém vai comer sangue ou não, ou se aceita transfusões ou não, vai depender do posicionamento de cada indivíduo. O que fica claro, pelo menos para a maioria dos Estudantes da Bíblia, é que não há proibição bíblica para comer e/ou tomar sangue. Veja também: https://www.ebbereanos.org/2017/12/sera-que-as-transfusoes-de-sangue-sao.html
Com base nos argumentos apresentados no artigo, com relação ao sangue humano, estaria então a prática da antropofagia (canibalismo) liberada entre os cristãos, visto não haver uma proibição direta ao uso de sangue humano? Não havia entre os gentios práticas de rituais onde eram utilizados sangue humano e até mesmo o sacrifício humano? Francamente, senhores, têm de ponderar mais sobre o assunto.
O argumento apresentado é uma falácia de falsa equivalência. Ele compara a transfusão de sangue, que é um procedimento médico seguro e eficaz, com a antropofagia e o sacrifício humano, que são práticas bárbaras e inaceitáveis. A transfusão de sangue não é uma forma de antropofagia. A antropofagia é o ato de comer carne humana, geralmente com fins ritualísticos ou religiosos. A transfusão de sangue, por outro lado, é o ato de transferir sangue de uma pessoa para outra. O sangue é um tecido vital que transporta oxigênio e nutrientes para as células do corpo. A transfusão de sangue pode ser uma forma de salvar vidas, especialmente em casos de emergência. O argumento também compara a transfusão de sangue com o sacrifício humano. O sacrifício humano é o ato de matar uma pessoa como oferenda a uma divindade. A transfusão de sangue, por outro lado, é um procedimento médico que não envolve a morte de qualquer pessoa. Assim, entendemos que a proibição bíblica para o não consumo de sangue foi algo temporário e específico para não ofender os cristãos de origem judaica. Prova de que era temporário é o fato de que o apóstolo Paulo, posteriormente, ter enfatizado que alguém comer de tudo, sem questionamentos: “Comei de tudo o que se vende no mercado, sem questionamentos por causa da consciência.” (1 Cor. 10:25) E também: “Se, portanto, algum descrente vos convidar para uma refeição e quiserdes ir, comei de tudo que vos for servido, sem nada questionar por motivo de consciência.” (vs. 27-29) Por fim, foi o próprio Senhor Jesus que disse: “Não é o que entra pela boca o que torna uma pessoa impura, mas o que sai da boca, isto sim, corrompe a pessoa.” (Mat. 15:11)